quarta-feira, 11 de maio de 2011

Os Senhores da floresta

 OS SENHORES DA FLORESTA


Ricardo Quinteiro de Mattos



Por varias vezes, nessa coluna, citei em rápidas pinceladas os nativos do Brasil e suas relações com o meio ambiente, passei alguns exemplos de conservação da natureza e de manejo sustentável dos recursos naturais utilizados por esses grupos. Porque para mim todo dia é dia de índio, é dia de aprender mais um pouquinho com eles. O estudo dos grupos nativos é de uma dimensão impressionante como é uma análise do resultado desse estudo.

Nunca dei muita trela para dia disso ou daquilo, porque todo dia é dia de tudo e de todos (as). Como agora tenho um novo entendimento, de que as datas comemorativas são importantes para chamar a atenção dos mais distraídos. Nesse sentido vamos dedicar esse artigo ao dia 19 de abril, dia do índio, aos povos pré-históricos – caracterizados pelo uso de instrumentos de pedra e por serem ágrafos - aos que fizeram história – catequizados - e aos nossos contemporâneos, tantos os que ainda vivem de forma primitiva nas florestas como os que foram aculturados.

Existe uma corrente de pensadores que não poupam os índios do desmatamento e que foram os primeiros a iniciar a destruição das florestas. O que é uma grande injustiça. Existem pessoas que definem os grupos indígenas como uma horda de preguiçosos e intolerantes. Julgam pelo que ouviram de colonizadores do séc. XIX. Outros que os criticam por lutarem por demarcação de terras e fazerem uso de tecnologias avançadas. Todo mundo critica os donos dessas terras. Fazer o quê? Vou tentar aproveitar esses argumentos para mostrar quem realmente são a forma de ver a vida dos membros desse importante grupo étnico.

Índios, nativos, gentios e selvagens – cada denominação por uma condição diferente - sem falar dos adjetivos. Como sempre vou optar pela convenção: índios. Foram escravizados, aldeados, assassinados e excluídos. Falar sobre todos os grupos, ou pelo menos pelas as informações por mim levantadas, seria necessário um livro. No momento vamos aqui nos deter a suas relações com o meio ambiente, como aprenderam assim viver e desmitificar alguns mitos. Como se tornaram os senhores das florestas.

Quando os europeus chegaram a Pindorama ( terra das palmeiras), aqui viviam muitos grupos de índios, no litoral e nos sertões. Os mais conhecidos eram os do litoral. Esses grupos foram identificados como Tupis, e os que não eram Tupis eram Tapuias. No séc. XIX houve outra tentativa de classificar todos os grupos e origem, foi outro fracasso e não vale à pena registrar, já que tem muita gente por aí ainda cotejando esses disparates. No inicio do séc. XX uma tentativa seguindo moldes antropológicos europeus, como medição e comparação de crânios, acabou só criando uma teoria. Ainda no final do séc. XX um antropólogo brasileiro classificou grupos étnicos da seguinte forma: pequenas famílias lingüísticas, e quando o grupo é grande, por tronco lingüístico. Feito da seguinte forma, o tronco Macro Tupi (fusão das línguas tupi e guarani), Macro Jê e Aruak. Ainda há outros que não pertencem a nenhum desses, que são dezenas de dialetos. Finalmente em 1953 foi realizada uma convenção de antropólogos para uniformizar a grafia dos nomes tribais.

Todos esses povos ceramistas são descendentes do homem do sambaqui, e dos pré-ceramistas, ambos muito antigos. São agrupados em tradições como: a Una, Humaitá, Umbu Aratu e a Taquara e Itararé, que não são consideradas culturas, são apenas limitados ao uso de mesma técnica de confecção de utensílios. Viveram entre o ano 2 a 10 mil AC.

Os ceramistas viviam em constantes guerras tribais até o séc. XIX. A maioria das batalhas era por vingança – da morte de um irmão, roubo de mulher e por espaço de caça - que se tornou um círculo vicioso. Isso não quer dizer que são maus ou não têm respeito pela vida. Já os grupos da Amazônia (com exceção do leste) e do pantanal demonstraram que esses não viveram e não vivem em guerra. A diferença é o espaço em que viveram e em que vivem.

A questão do canibalismo é uma discussão muito ampla, resumindo, é uma prática filosófica de absorver as qualidades de valor do inimigo. Não tem nada a ver com cardápio ou predileção palatável.

Dos tupinambás é que temos mais informações, porque a língua tupi foi transformada em língua brasiliana ou língua geral do Brasil. Os Guaranis que falavam parecidos tiveram a língua incorporada e os demais que eram todos chamados de Tapuias, quando aprisionados ou aldeados tiveram alguns que assimilar a língua tupi.

Aqui na Zona da Mata, por exemplo, há vários núcleos urbanos: com topônimos indígenas do tupi (Piacatuba Pirauba, Paraibuna), mas os que aqui viveram falavam Macro Jê, eram Puris Coroados, Coropós e Aimorés. O topônimo Cataguases é uma exceção, os Cataguás eram do tronco Jê, e nem viveram aqui. Fica parecendo que todos aqui falavam tupi e não é assim. Eu fico pensando até quando ficarão esses povos desconhecidos pela nossa comunidade? Quando será possível falar deles saindo do achismo? Ou fazendo associações descabidas.

Outra coisa que falam por aqui, é que os Puris são descendes dos Goitacás do litoral, e que o nome Puri é uma forma pejorativa dos seus inimigos, de denominá-los. Até entendo que no inicio do séc. XX alguns pesquisadores como o Alberto Lamego - muito bom geólogo, mas não era especialista em índios, – fizessem tal afirmação, mas agora com recursos que temos, não dá para ficar repetindo esse tipo de coisa.

A síntese da vida desses povos era: a liberdade, a vida na mata e a vingança. Entre os do tronco Jê havia uma cresça de quando o individuo era mau e morria, seu castigo era reencarnar em um morador dos campos abertos. As matas eram o paraíso e os campos o inferno.

Alguns viajantes europeus que passaram por aqui tanto pesquisadores, pintores e memorialistas, descrevem os grupos da Zona da Mata como pessoas rústicas sem beleza. Mas o que é beleza, qual critério para enquadrá-la? Já falei sobre isso em outros artigos e que nos retornaria ao campo do preconceito e do estereótipo de beleza criado pelo europeu. No entanto, um desses viajantes, o Príncipe Alberto da Prússia que esteve uma visão diferente.

Felicidade para eles era a pescaria, a coleta das frutas; a contemplação do seu ambiente; fazer longas caminhadas; nadar no rio ou no mar; dançar, beber o cauim e saborear a carne moqueada. Nós só podemos fazer isso nos fins de semana, acho que somos semi-felizes, É como eu digo: cada um com seu cada um.

Os índios observavam e imitavam os pássaros em seus cantos e danças e depois repetiam para suas mulheres. Como as abelhas, adoravam as flores e os curumins chupavam seu néctar. Observavam a degustação de frutas de vários animais. Imitavam a onça na espreita da caça, a lontra na natação e a anta na busca do sal.

Tem um registro feito por um missionário protestante francês, de um ancião Tupinambá que lhe deu uma lição de ecologia e amor a natureza.

É de uma lição de moral e de princípios aos colonizadores e a nossa geração.

Em uma visita a Pedra Dourada, MG, com o fotógrafo Vicente e o Presidente do IFSP, Marcelo Peixoto, tivemos um papo com o índio Xingu Itatuitim Ruas, que é filho de criação de Rondom. Ele tem uma história de vida de superação, quase foi sacrificado ao nascer e chegou a ser chefe de varias delegacias da FUNAI. Entre tantas coisas dos costumes dos índios, ele nos contou que o Pico da Bandeira no Caparaó, é uma montanha sagrada, morada do Deus Rudá o Deus do amor. Na chegada da primavera, os pajés de todos os grupos de índios do sudeste iam para lá realizarem rituais religiosos. Uma das trilhas hoje é chamada de Caminho da Luz, só indo para ver a dimensão da energia. A explicação é que a reunião anual era para purificação dos espíritos dos componentes dos grupos e para pedir para natureza fartura ao novo ciclo, que se iniciava. Há registros de outras caminhadas dessas, feitas pelos Guaranis do sul.

Em um segundo encontro com Itatuitim, em Pedra Dourada, dessa vez com a jornalista Monique Gardingo, propositalmente perguntei na presença da minha amiga o significado de Cataguases, nome da nossa cidade e do rio localizado no município de Prado. Foi proposital por que quando lancei o livro, “Uma Viagem no Tempo Pelas Terras de Cataguases, em 2002, muitas pessoas não ficaram satisfeitas com o significado apresentado para Cataguases. Mesmo eu argumentando no livro que é um belo atrativo para a cidade o significado de “Terra de Gente Boa”. Embora seja um equívoco. Itatuitim Ruas, respondeu sem pensar ou fazer jogo de silabas, em somatórias infindáveis como fazem alguns autores. Disse ele na bucha: - Mato rígido! A Monique ficou espantada e eu ganhei uma testemunha ocular. É muito simpático e hospitaleiro continuar dizendo que Cataguases quer dizer “Terra de Gente Boa” e isso eu aceito com o turista. Mas o que não posso aceitar e se continue ensinando errado nas escolas.

Em São Paulo há mais topônimos com nomes indígenas do que em qualquer outro Estado da região sudeste, lá o homem do sertão utilizou dos mesmos artifícios dos índios de observar a natureza e para isso assimilou os costumes convivendo e aprendendo com os índios, nos episódios das entradas e bandeiras, o que lhes facilitou o aprisionamento e a escravidão. Na Zona da Mata mineira em aldeamentos missionários e na catequização espalhada ao longo dos rios Pomba, Chopotó, Paraíba, Muriaé e Doce a convivência ajudou em muito. Uma pena foi a guerra declarada aos Aimorés que os exterminou e a entrega de curumins Puris e Coroados a famílias de colonos, uma forma de diluição étnica.

Quanto à matriz etimológica de todos os troncos e da origem de grupos e Pindorama, me resigno a ouvir todas as hipóteses antropocêntricas eurocentristas de migrações, desde a passagem do indo europeu pelo estreito de Bering na última glaciação, até as rotas oceânicas via Polinésia no pacífico, diga-se de passagem, a menos fantasiosa. Acredito no autoctonismo nas Américas. Baseado em que? Ainda não tenho provas só subsídios, portanto ficamos aqui por enquanto.

A língua e os dialetos são dinâmicos e se adaptam a um novo contesto de tradições ou cultural. A linguagem evolui. As migrações internas – nas quais acredito e são provadas – trouxeram essa diversidade de tradições encontradas em vários pontos desse território.

Durante os primeiros 400 anos de história do Brasil construíram uma imagem dos grupos de nativos como decadentes e com dias contados, justificando a matança desenfreada. Com raras exceções ficou registrado o que sobrou desses grupos e de quem lutou por sua defesa como: Anchieta e Nóbrega, José Bonifácio e Guido Marlière, que de uma forma, ainda que ortodoxa adiaram ou amenizaram o sofrimento desses povos e Marechal Rondom e irmão Villas Bôas com propostas mais adequadas.

Com tanto pré-conceito com esses grupos, agora entendo por que ao serem diluídos serviram como exemplo para outros grupos que resistem bravamente e se impõem.

Não podemos mais ficar apenas entre duas opções: matá-los ou conservá-los. Temos que respeitar, independente de grau de tradição, de cultura e de desenvolvimento.

Como dizia Frederico, um dentista amigo meu já falecido, “a democracia é a ditadura da maioria” eu completava: governada por uma minoria em favor de suas próprias idéias. Foram-se os Puris e o Frederico. Ficaram as tradições e outros militantes. Bons tempos. Pena que uns tombaram, outros se refugiaram no anonimato e outros se travestiram.






terça-feira, 10 de maio de 2011

Obama não sabe de nada sobre o Brasil





Obama, muito simpático, chegou aqui no Brasil e fez média. “Se o Brasil é o país do futuro, o futuro chegou”, disse ele. De duas uma: Ao chegar à escada do Neoclássico Teatro Municipal ele parou, olhou para a fachada do prédio e em seguida para a esquerda, viu a fachada do prédio da Câmara Municipal, virou-se para a direita, viu a fachada da Biblioteca Nacional, virou-se mais um pouquinho e contemplou a Baia de Guanabara e assim como os navegadores portugueses, pensou: “ Deve ser um rio” e concluiu que o Brasil é um país da Europa. Ou ele não visitou os rios Miriti, Iguaçu, o córrego Lava-Pés, o lixão de Gramacho, ou um hospital publico. Não entendo um futuro com injustiça social.